Paracetamol – amplamente utilizado e praticamente ineficaz

31/07/2017 15:32

Pessoas com dor têm um desejo muito simples. Elas querem que a dor desapareça, e elas querem isso já. Durante muitos anos, o paracetamol tem sido o medicamento para todos os tipos de condições de dor aguda e crônica nos EUA e na Europa. No Reino Unido, inclusive, é recomendado para dor nas costas e osteoartrite, seja sozinho ou em combinação com opioides (drogas que atuam no sistema nervoso para aliviar a dor).

O sistema de saúde primário na Inglaterra gastou 87 milhões de libras em paracetamol em 2015, muito disso para condições de dor crônica – e isso não inclui quantidades igualmente elevadas para combinações de dose fixa de paracetamol e opioides. No Brasil, ao menos, ele não está sozinho no mercado, disputando as dores com a dipirona. Mas existe forte campanha publicitária para incrementar suas vendas.

Funciona ou não

Uma revisão sistemática publicada na base de dados Cochrane não deixa dúvidas – não funciona. Nem na hora, nem mais tarde. Em nenhum momento entre uma e 12 semanas a dose máxima de quatro gramas por dia foi melhor do que um placebo no tratamento da dor lombar aguda. Tampouco a revisão encontrou evidências de que ele funciona na dor lombar crônica. É realmente constrangedor quando uma prática quase universal – usar o paracetamol – se revela um embuste.

A alta qualidade desta revisão não pode ser contestada, então vamos dar uma olhada em outras que avaliaram a eficácia do paracetamol em outras condições de dor crônica. Na osteoartrite, nossas melhores evidências indicam um benefício pouco significativo em relação ao placebo. Para a dor neuropática crônica, uma revisão Cochrane ainda em curso, revela uma completa falta de eficácia do paracetamol. Além disso, o paracetamol não tem efeito na dor de câncer, e é pobre na dor pós-operatória aguda e enxaqueca.

Ao menos é seguro?

Um medicamento que está no mercado há mais de 50 anos deve ser seguro, não é? Bem, essa ideia de segurança também não é verdadeira! Evidências cada vez mais fortes trazem bom motivos para nos preocuparmos. O paracetamol está associado ao aumento da mortalidade, efeitos adversos cardiovasculares (infarto do miocárdio fatal ou não fatal, acidente vascular cerebral ou doença cardíaca coronária fatal), eventos adversos gastrointestinais (úlceras e complicações como hemorragia gastrointestinal superior) e insuficiência renal.

Um estudo americano com uma população de pessoas que usaram paracetamol mesmo em doses moderadas mostrou que ocorreu duas vezes mais casos de insuficiência hepática aguda nesse grupo de pessoas, inclusive com indicação para transplante de fígado, do que pessoas que usaram outros tipos de anti-inflamatórios.Para dizer o mínimo, o paracetamol não alivia a dor de forma efetiva, e ainda apresenta efeitos adversos que até podem ser considerados raros, mas são muito graves.

Se fossem apenas alguns comprimidos, talvez poderíamos deixar isso de lado, mas não são. O consumo de paracetamol é medido não em quilogramas, nem mesmo toneladas, mas milhares de toneladas por ano. Tanto a saúde como as questões éticas estão sendo ignoradas.

Carlos Rogério Tonussi
Tags: ArtriteAspirinaDorfígadoParacetamolPlaceborim